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segunda-feira, 22 de maio de 2006

Acto




É neste delírio nocturno que me excita uma doçura de inferno. Sempre que passo por ti sinto o teu cheiro. És fêmea, carne de mulher, explosão de sentir. No teu toque apaixono-me, sabendo que no teu calor me queimo. Olha-me nos olhos e beija-me numa passagem intensa por este túnel de luz.

Descia eu por entre nuvens e sonhos, amarrei longas asas nestas costas que carregam todo este meu mundo. É interessante saber que a luz e o palco são meus. Bate palmas, sozinha, para mim.

Fecho-me no camarim. Suspiro. Perco-me no reflexo do espelho, permito-me a ser um pouco narcisista. Envelheço. Vaidade que me conforta, sou belo aqui na minha solidão. As luzes quentes aquecem-me o rosto. Falo de mim, para mim, sem ser eu que oiço… qualquer coisa assim. Paro, suspiro novamente. Assaltas-me a memória constantemente, violas o melhor do meu íntimo. Os teus lábios cercam-me em pensamentos. Sinto tamanho desejo, tomo medo e reconstruo muralhas antigas. De tanto desejo torno-me frio, metódico e manipulador do sentir. Sou propriedade e proprietário desta longa, pesada e complexa máquina de fazer viver. Abraço-te em pensamento, entrego-me e escondo-me. Desapareço por entre brumas neste respirar de antepassados.

Continuo a afundar-me frente ao espelho, bem dentro de mim. O suor que me escorre pelo rosto, os teus dedos que me apertam, asfixiam-me de prazer. Este gozo entre a verde e virgem folhagem, cheiras a terra. Afago os teus cabelos, raízes de fogo, provando, trocando venenos. Quero-te deixar para poder voltar novamente. Quero-te matar para que em futuras danças renasças mais uma vez em mim.

Visto-me, apago as luzes e saio pela porta principal. Apetece-me consumir coisas triviais. Troco um olhar com uma desconhecida, sorri. Acendo um cigarro e caminho pelo passeio. Tento pisar todas as poças de água, é giro.
Sinto-me bem.

7 comentários:

Anónimo disse...

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Vive feliz...
enquanto souberes e fores capaz.
Tudo o que é bom e belo,
é fácil de perder...
Se esvai e nos escapa,
como o silvar do vento.
A vida,
compra e vende com avidez,
vícios,erros,
perdição e orgulho...
num atropelo cego
de fugidios prazeres.
Como se amor pleno
fosse maldição
e o coração ferido,
o fim deste novelo!

~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~

Anónimo disse...

Para mim, é sem dúvida um dos teus melhores textos.
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Acto
Acto de viver
Acto de sentir
Ser actor, espectador, encenador, produtor
Todos fazemos parte
Todos aqui pertencemos
No que cada um de nós faz e pensa é que está a diferença
Sejamos todos felizes, de olhos fechados ou não
Com ponto ou sem ponto
Camuflados ou não
Decorando o papel ou apenas improvisando...
A todos:
Partam uma perna!

Anónimo disse...

Morro e renasço,
de cada vez que te respiro.
Parto e permaneço,
de cada vez que te amo.

Anónimo disse...

................
Fiz de mim o qu não soube.
E o que podia fazer,não fiz.
O dominó que vesti,era errado.
Conheceram-me por quem não era.
E eu não desmenti e perdi.
Quando quis tirar a máscara,
estava-me pegada à cara.
Quando a arranquei e me vi,
já tinha envelhecido...
E não me reconheci!

Fernando Pessoa

Em todas as palavras,se escondem reflexos e penumbras da vida.
Bjs amigos

Anónimo disse...

já tinha lido este texto, e de todos os que já escreveste, este está entre os meus preferidos. A opinião já ta dei. É que parece mesmo que estou em frente de um palco, que estou na plateia a ler a tua história. Já to tinha dito não é? Também te disse que feches sempre a porta quando saires..

Anónimo disse...

e tantas vezes o que
sentimos é o vazio do final
...o vazio do sair sempre
pela porta dos fundos.cansaços.

retiro o que disse... disse...

http://www.youtube.com/watch?v=bcrEqIpi6sg

"But now it's just another show
You leave 'em laughing when you go
And if you care, don't let them know
Don't give yourself away

I've looked at love from both sides now
From give and take, and still somehow
It's love's illusions I recall
I really don't know love at all"