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terça-feira, 10 de abril de 2007

Foste

Bate a hora, apressada, disfarçada em manto que esconde o tempo que não se quer esperar.

- Espera-me. Não corras. Ouve-me por um instante.

- Não posso. Não quero ouvir-te. Tenho pressa de chegar.

- Não vás! O caminho atraiçoa. Não vês? Ouve-me, não queiras seguir o mais óbvio.

- Mentes. Toda a tua linha de discurso é um rol de certezas que me incomodam. Não maltrates quem sou, com a tua inabalável e irritante má disposição.

- A minha razão, seja qual for, é diluída em qualquer teor de discurso. Volátil, és como álcool na minha ferida exposta ao sol. Só queria que te guiasses por mim uma única vez.

- Não! A minha pressa é forte e espessa. Tamanha vontade de fugir, de mim. Necessito de desaparecer.

Espesso, disseste. Clamaste em tom monocórdico, a decisão há muito pensada. Espesso, como sangue que arrefece, na chapa contorcida, espalhada pela estrada.
Forte, confinaste todos os teus sonhos ao que eram, apenas sonhos. Pendurados por um pequeno fio de seiva, no abismo que existia em ti.

Forte. Demais para sobreviver. O choque.

Despedaça-se ao critério do embate, o corpo que sai de outro. A alma que descola da pele.

Contornos, estes que adornam agora as minhas tábuas. São condados, na importância que lhes dei, os meus sonhos e aspirações. Os instantes em que pensei, seguir as tuas marcas no chão. Invejei-te todos os dias.

- Não me sigas, nem me aguardes. Vou. Apenas vou.

Toma-te essa sede de forma tão violenta. Nem recordas quem és, e que no fundo, tens tudo guardado, em caixa de fundo falso. Escondido, dissimulado nos medos, no próprio medo de me ouvires.

Jazido, no escuro impar do oceano. Tenho o meu nome pensado, guardado na mala.
Recordo-te enquanto sigo para bem longe.
Tão longe, para além de tudo, até de mim. Distante, contando cada linha do tracejado da estrada, até me reencontrar no ponto de partida.

De novo, sem que esperasse, hesitaste tanto na hora. Demorada, por todas as pequenas coisas que julgamos não terem importância. Partiste quando escolheste. Tanta fúria me ofereceste, ofendida por te querer cobrar um minuto de atenção.

- Então vai. Força! Vai!

- E vou mesmo!


E foste. Para sempre.

10 comentários:

Anónimo disse...

o que toco, torna-se luz
o que abandono, carvão
sou certamente labareda.

não pude evitar parafrasear F. Nietzsche... ;) bisou*

Aestranha disse...

Que estranho... até ao final do texto achei que era uma conversa de ti para ti...

Mas, de ti para ti ou de ti para outrém não tem importância... Há momentos em que é preciso ir, sentir a liberdade estonteante e imediata de bater com uma porta e ver o céu... Mais tarde paga-se o raro e caro preço do remorso...

Beijos

Anónimo disse...

Só sei o caminho para ti, meu amor!

Anónimo disse...

inda bem que ela foi!..não te merecia. Bem feito!..Agora chora..(tu não; ela!)

Eme disse...

nã! era o teu sábio. Falavas com o teu sábio. Mas não o devias ter deixado ir. Vais sentir a falta dele..

amélie disse...

RE: http://mizzotint.blogspot.com/2007/04/blog-post.html


sim é da mnh autoria

mnica ;* disse...

como é singular o efeito de abandono... abanddono dos sonhos!

Só posso falar do que a pele já cicatrizou: nunca esquece!
Guardarás as memórias atabalhuadamente para ganhar pó. de tempos a tempos, voltas e arrumas mais um pouco...

Mas crias uma vida nova! ou melhor: dás-lhe um novo rumo, novos sonhos e novas alegrias!

é uma ressurreição ao nosso tamanho!

Alento, mas não deixes de chorar a dor e sorrir a alegria que virá!

Jinhos ;* (de coração apertado, por lembrar as minhas próprias dores... como gostava que ninguém tivesse que passar por algo semelhante...) Força!!

moleskine - 80 pages of art disse...

é enviado um caderno que passa por uma serie de pessoas que sao convidadas a preencher uma pagina:

http://moleskine80pages-art.blogspot.com

Inscreva-sa e divulgue!

Anónimo disse...

O querer ficar
O querer ir
O deixar ficar
O chorar por ir...

Para sempre?
Não existe para sempre...
Apenas o existe exite!

Saudações marvelágicas e vermelhampadas!

eudesaltosaltos disse...

Leio-te sp c atenção. dzs sp mais do q o significado literal das palavras q escreves... gosto. bj