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sábado, 10 de novembro de 2007

Tácito

Agonizava em qualquer método de transporte sensorial, mantendo em constante paralelo à realidade, uma fina ideia de purificar as palavras a dizer. Não sabia quando, nem ao certo no espaço, quão maior seria o bater do coração, esperava apenas.

Mais dor não seria, nem queria. Saber ser a pessoa que se transporta para o reflexo, sem passar dos limites da própria sombra. Em dúvidas mordazes, destabilizei-me num segundo mais curto que outro do tempo normal.

Havia lamentos bem piores, eu sei ao que sabem. A constante voz, vinda de um abismo existente em mim, mais me interrogo pelo desconhecido que pelas incertezas assaltantes da noite em que me transformo. A voz, pensava eu, pesaria numa eternidade caso a ignorasse. Pena minha, seria essa bem pior que a ouvir em todo o momento. Sabe-me de cor, em todas as línguas, matando-me de desejo em todos os pontos finais.

Fumo sem saborear a toxicidade oferecida nas palavras, sem gestos aparentes nas ideias. O nocivo que soa ser-se, fazer-se, corresponder-se às linhas tão iguais. Torno-me num arquejo de fumo, tentando em desespero dissipar-me pela incomensurável atmosfera.

Existo sem aparecer, sou sem me ver. Quedo-me na pouca vaidade que me consola, palavras apenas usadas em privado, nesta sempre persistente mania de que a minha pessoa é grande.

Jamais trocaria o sentido e remar na direcção supostamente certa. Nem bússola que se me crave no peito dos sentidos me levaria por outros caminhos. Melhor assim, não sendo mais que isto, assim mesmo.

Estabeleço o contacto com o exterior, nos olhos de quem me vê, sendo a nudez a partitura de um momento de vida. O exagero da minha pessoa, ignorando saber que todo o contacto a existir é tão mais que um gesto, um toque.

Inoportuna, surge a voz consumista, respirando o mesmo perfume em duo. Os pulmões são meus, a vontade não. Há palavras proibidas, ideias para além das mesmas. Trago-me na vontade de fechar os olhos e descansar.

Descubro marcas, adivinhas nas pistas contadas pelos seus dedos. Ela, a voz que me soa tão familiar, encorpada em veludo, tingida nos tragos frutados e maduros.

Ela é, a voz que me dói.

11 comentários:

ContorNUS disse...

como eu gosto das sílabas...à luz desta lâmpada...

que dizer qd sinto o pulsar das letras?

Ás de Copas disse...

Sofre(dor)
Afonia de ser
Agonia de sentir
Sem pontos finais

A
pontuação
asfixia
me

Eme disse...

Hum...

O escuro útero da dependência.

Neste caso, da dor, da voz.

Anónimo disse...

Eu já te visitei várias vezes, mas nunca tinha comentado. E porquê? Porque fico sempre sem palavras... Sabe tão bem ler-te... que me parece que acrescentar alguma coisa seria estragar.
You definitely have a way with words....

Beijinho

Jo disse...

"Ela é, a voz que me dói."
Dor que desatina sem doer?
Belo, como sempre.
Beijo*

Red Light Special disse...

Há dores, lamentos, agonias... que nos purgam a alma e fazem descobrir o diamante em bruto dentro de cada um de nós.
Para mim é um prazer encontrar-te assim... porque essa voz que te doi faz libertar em ti o dom da palavra... o diamante que há em ti
Ler-te é orgásmico... mesmo muito bom!
Como sempre...
beijo...

Haushinka disse...

As tuas palavras são uma música rara... Uma verdadeira adição.
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E já agora obrigada pelos comentários, de facto há sempre uns belos cromos por esse mundo...

RC disse...

Ele é, a dor que me dá voz.

Beijo

Anónimo disse...

Muda...de voz.
Muda
Muda
Muda
Chiu!

Aestranha disse...

"Inoportuna, surge a voz consumista, respirando o mesmo perfume em duo. Os pulmões são meus, a vontade não. Há palavras proibidas, ideias para além das mesmas. Trago-me na vontade de fechar os olhos e descansar."

Quem me dera ter eu conseguido escolher estas palavras e dar-lhes corpo assim... Só acho é que me trago na vontade de ainda não descansar... Mesmo que doa, e dói..

Beijos e fui ver as fotos das "bruxinhas", adoro as tuas fotos... Quase tanto como as tuas palavras...

Mais beijos

Simone disse...

Brilhante!
Beijinhos